A ênfase dada pela mídia aos evangélicos nas eleições deste ano despertou muitas perguntas em setores da sociedade que não conhecem o mosaico que forma o perfil das denominações, protagonizado por líderes de influências diferentes, assim como pensamentos.

A revista Época publicou uma reportagem sobre “o jeito evangélico de pedir voto e fazer política”, assinada pelos jornalistas Flávia Tavares e Tiago Mali. Para a dupla, os evangélicos demonstram habilidade ao driblar as imposições da lei eleitoral sem desrespeitá-la.

“Por lei, ele não pode pedir voto no culto. Pode, no entanto, suplicar que rezem por ele. Até outubro, esse tipo de cena se multiplicará nos milhares de igrejas do país. Candidatos evangélicos de diversas denominações (só pastores são 270) tentarão chegar ao Congresso”, escrevem Flávia e Tiago, traçando um perfil do candidato que se identifica como evangélico.

A reportagem ilustrou “o jeito evangélico de pedir voto” com o caso do pastor Rodrigo Delmasso, 34 anos, da igreja Sara Nossa Terra e candidato a deputado distrital em Brasília, o que equivale a deputado estadual nos demais estados do país.

“Seu raciocínio é simples: não é pecado usar o púlpito para falar de um país melhor, para incentivar o fiel a exercer seu papel de cidadão. Desde que não se peça voto”, descrevem os jornalistas, que destacaram que em 2014, são “345 postulantes a um mandato que usam na urna títulos como ‘pastor’, ‘bispo’ ou ‘missionário’”.

Delmasso argumenta em defesa da legitimidade do uso do título eclesiástico como forma de identificar ao seu público quem ele é: “Qual a diferença para um candidato que vai para a frente de uma fábrica, falar para os eleitores de seu setor? Muitos ainda usam o nome de Deus em segmentos que não têm nada a ver… É a pluralidade da democracia. A igreja é uma entidade social que representa um estrato da sociedade. Um bancário se elege para defender seus pares. Um taxista também. Se as categorias têm esse direito, por que a igreja, uma expressão da sociedade, não teria?”, argumenta o pastor, formado em gestão pública e com pós-graduação em serviço social.

Os jornalistas observam o fato de que os candidatos apoiados pelas igrejas estão cientes sobre a característica do eleitor evangélico, que é mais resistente que os demais grupos sociais, e explicam que eles ficaram reticentes “depois de tantos escândalos de corrupção envolvendo políticos que atuam sob o signo da fé”, e citam o caso das sanguessugas, revelado em 2006. “Tratava-se do desvio de dinheiro público destinado à compra de ambulâncias. Um dos acusados foi o bispo Carlos Rodrigues, da Igreja Universal do Reino de Deus, mensaleiro condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Naquelas eleições, a bancada evangélica no Congresso caiu de 61 para 36 parlamentares. O fiel passou a ver com imensa desconfiança o engajamento de seus líderes com a política”, contextualizam.

Por fim, os jornalistas da revista Época lembram a heterogeneidade do público evangélico e as subdivisões existentes entre as igrejas. “Nem todas as denominações são inclinadas ao palanque. A divisão mais comum é entre evangélicos de missão (as igrejas mais antigas, como batista, adventista e presbiteriana); pentecostais (as nascidas no início do século XX nos Estados Unidos e no Brasil, como Assembleia de Deus, Congregação Cristã no Brasil, [Igreja do Evangelho] Quadrangular e Deus é Amor); e as neopentecostais (criadas a partir dos anos 1970, como Universal do Reino de Deus e Sara Nossa Terra). As evangélicas de missão têm entre seus dogmas não se envolver diretamente com política. As pentecostais e as neopentecostais adotaram uma postura mais engajada desde o fim da ditadura. Foi quando a Igreja Católica aumentou sua bancada no Congresso. Os evangélicos temiam perder espaço e influência”, concluem.