Pastor e escritor Eduardo Sampaio fala sobre a geração de pregadores “oportunistas”

Por Monique Suriano
moniquesuriano@yahoo.com.br

O JRE aproveitou a passagem do pastor e escritor Eduardo Sampaio pela II Escola Bíblica de Obreiros e Membros realizada na Catedral das Assembleias de Deus em Santa Cruz e fez uma entrevista. Aos 71 anos e com 16 livros publicados, Eduardo Sampaio é mestre em Teologia e Terapeuta da família. Entre seus títulos mais conhecidos estão “Meu Ministério: Chamas ou Cinzas?”, “Ministro Despenseiro” e “Tesouros em Vasos de Barro”.

Na palestra ministrada em Santa Cruz, Eduardo Sampaio falou abertamente sobre assuntos relacionados à conduta do cristão. “Ética é aquilo que você faz quando todos te observam, caráter é aquilo que você faz quando ninguém te vê. A maioria se preocupa com a reputação, poucos se preocupam com o caráter. E o caráter do homem deve ser como uma rocha: imbatível. Perca tudo, mas não perca o caráter; porque se você perder a dignidade, você perdeu tudo. Na minha trajetória ninguém nunca conseguiu me comprar. Eu não tenho nada que foi fruto de uma corrupção, de uma barganha suja. Paga-se muito caro para conservar a dignidade, mas vale a pena”, enfatizou ele, que no evento dividiu a tribuna com os pastores Abner Ferreira e Enoque Vieira.

Na entrevista concedida com exclusividade, Eduardo Sampaio falou sobre a missão evangelizadora da igreja e as implicações do evangelho da pós-modernidade. Entre outros assuntos polêmicos, ele ainda discorreu sobre a geração de pregadores “oportunistas”. Leia na íntegra.

JRE: Qual é o maior problema da igreja do século XXI?
Pr. Eduardo Sampaio: É cumprir a missão que ela não cumpre. Quando chegarmos ao tribunal, nós vamos ser arguidos por alguns motivos: O que fizeste do meu ide? O que fizeste da minha glória? O que fizeste da minha Palavra? Hoje a maioria não quer pregar o evangelho, porque o evangelho não dá ibope, o que dá ibope é revelar e profetizar. A igreja primitiva cumpriu o ide muito bem. Ela ouviu, entendeu, e atendeu a ordem. A igreja primitiva alcançou o mundo sem carro, sem microfone, sem som, sem internet, sem nenhum sistema de comunicação.  Na igreja primitiva tudo era comum. Não estou falando que eu tenho que vender minha propriedade e trazer tudo para a igreja, mas que precisa haver mais liberalismo entre nós, há muito egoísmo no meio cristão.

JRE: O senhor ainda pastoreia igreja?
Pr. Eduardo Sampaio: Eu pastoreei durante 30 anos. A última igreja foi a Catedral das Assembleias de Deus de Brasília, que eu pastoreei por 16 anos. Em 2009 eu entreguei a direção da igreja e fiquei atuando na área de evangelismo itinerante, e essa é minha função até hoje. 70% do meu ministério estão ocupados em trabalho com famílias. Sou Terapeuta familiar e dou seminários e palestras voltadas para os casais, no Brasil e no exterior. Mas não gosto de ser chamado de conferencista, porque hoje a palavra tem uma conotação diferente. O conferencista hoje é aquele que faz grandes movimentos, mas quando tudo termina, ele fica com o bolso cheio de dinheiro, e o povo fica com fumaça na cabeça e cinzas no coração.

JRE: E por que a conotação da palavra conferencista mudou?
Pr. Eduardo Sampaio: Porque a conotação do evangelho também mudou. O evangelho na Europa virou instituição, lá na Grécia virou cultura, nos EUA virou negócio, e no Brasil virou eventos. Só se pensa em grandes festas, grandes pregadores, grandes cantores, e a preocupação precípua da igreja, que é evangelizar, está ficando renegada, em segundo plano. A missão da igreja na terra é evangelizar; a igreja que não evangeliza, se fossiliza, está dormindo no conforto da mesmice. Sabe qual a diferença entre a igreja de hoje para o mundo? É que o mundo dorme nas trevas e a igreja dorme na luz.

Fala um pouco mais sobre essa mudança no cristianismo?
O evangelho da pós-modernidade é muito fraco, é um evangelho sem compromisso, sem responsabilidade, um evangelho que atinge o emocional das pessoas. Hoje as pessoas procuram igrejas que ofereçam uma mensagem emocionante. Quando uma pessoa sai da igreja achando a mensagem interessante, significa que ela saiu da mesma forma como entrou; não há mudança. Mas quando uma pessoa diz que a mensagem foi dura, que cortou como navalha, que foi igual à pimenta malagueta, aí sim o evangelho mexeu. Porque o evangelho é espada, é martelo. O evangelho precisa incomodar os acomodados e acomodar os incomodados. Ele não tem a função de propiciar uma mensagem que massageie o ego, que fique mimando pecado. Jesus disse: “O mundo os odiou, porque não são do mundo, assim como eu não sou do mundo” (Jo 17.14). Quando o mundo não aborrece a igreja, significa que a igreja está em conchavo com o mundo, ou, pelo menos, está omissa, calada.

E qual seria a solução para esses problemas?
O caminho é voltar ao primeiro amor. Eu só vejo esse caminho.

E como o senhor definiria a atual geração de pregadores?
A maioria dos pregadores de hoje não se incomoda mais com o pecado. Em algumas igrejas eles até recebem a orientação do que podem ou não falar. Eu costumo dizer, que se Cristo pregasse o evangelho que os pregadores estão pregando atualmente, ele nunca teria sido crucificado. Por isso que eu digo que é um evangelho fraco, que não sacode a pessoa, não arranca da inércia, do conforto, da mesmice. É lamentável, mas pouquíssimos são os líderes no Brasil que estão preocupados com a salvação das almas. Já preguei em grandes congressos, com cerca de três mil pessoas, em que nenhuma alma aceitou Jesus. Isso é ridículo! Nos anos 70 e 80 isso não acontecia de forma alguma. Naquela época, nós medíamos se o evento tinha sido bom ou não, pela quantidade de pessoas que aceitavam a Jesus; eram 30, 50, 80, 150 pessoas se entregando para Jesus quando terminava o congresso. Hoje, se alguém perguntar como foi o congresso, a resposta é: “foi maravilhoso, quem cantou foi fulano, quem pregou foi cicrano”. Isso é inversão de valores! Os expoentes de hoje são os homens; Jesus está na cruz e alguém está no trono reinando.

E como escolher os pregadores certos para ministrar na igreja?
Deixa eu te dar o meu exemplo. Eu fui pastor durante 30 anos, e poucos foram os pregadores que eu convidei. A maioria dessas pessoas são oportunistas, elas querem mais aparecer que cooperar. Quem deve alimentar a igreja é o seu líder, o pastor. Eu vejo essa questão de convidar pessoas com muita reserva, tem que ter muito cuidado, saber muito bem quem é a pessoa que vai subir ao altar.

Em sua opinião, o obreiro precisa ter curso teológico para ser pastor?
Particularmente, digo que sim, pois não podemos banalizar, nem minimizar o conteúdo chamado ministério. Primeiro que o ministério não é meu, o ministério é do Senhor. Paulo foi posto no ministério: “E dou graças ao que me tem confortado, a Cristo Jesus Senhor nosso, porque me teve por fiel, pondo-me no ministério” (I Tm 1.12). Não podemos minimizar o ministério consagrando pessoas por mérito, o ministério é uma coisa muito séria. É necessário ter vocação e preparo. Vejo muitos pastores por aí sem preparo algum para ministrar casamento, velório. Eu, particularmente, vejo a necessidade de pessoas preparadas. Graça e conhecimento precisam andar lado a lado. Só graça é fanatismo, só conhecimento é formalismo, tem que haver um equilíbrio. Eu nunca subi no altar sem saber o que eu ia pregar. É preciso preparação.

Foto Luis Fernando Magão